"A satisfação das necessidades educacionais, atenção precoce, acompanhamento escolar, integração social, cultural e laboral de pessoas afetadas pela alteração conhecida como acondroplasia e outras formas comuns de nanismo. Da mesma forma, a Fundação terá como objetivo resolver problemas de saúde e promover o desenvolvimento físico e psíquico, criar um arcabouço legal e social que facilite o desenvolvimento dos objetivos supracitados, promover programas de pesquisa e métodos de prevenção, diagnosticar e tratar a referida alteração conhecida como acondroplasia” (http://www.fundacionalpe.org/es/quiénes-somos/historia).
De fato, desde a sua criação em 2000, a Alpe tem sido não só uma poderosa voz contra o preconceito social e político, mas também tem oferecido conselho, cuidados e apoio a uma comunidade cada vez maior de famílias da Espanha e de muitos países do mundo.
Na semana passada, a Fundación Alpe realizou a sexta edição do Congresso Internacional de Cirurgia Plástica (www.congresoalpe2018.com/). O que torna esse evento distinto daqueles mantidos por outros grupos é que a Alpe organiza um programa abrangente, abordando a maioria dos aspectos relacionados à acondroplasia e displasias ósseas, desde tópicos como inclusão social, educação e direitos civis até aspectos médicos e de saúde, incluindo a pesquisa sobre novas terapias farmacológicas. A Alpe também tem trabalhado para apoiar associações de nanismo em outros países.
Falando sobre terapias, durante a reunião da semana passada, especialistas de todo o mundo apresentaram suas visões e experiências sobre tratamentos atualmente em desenvolvimento para a acondroplasia, como o vosoritide, o TransCon-CNP, o TA-46 e o infigratinib, e também desafios a serem superados. Fui convidado para falar sobre potenciais terapias que não estão sendo exploradas no momento. Esta foi uma experiência rica, um privilégio para mim, e quero compartilhar minha apresentação com você. Note que quase todas as terapias potenciais apresentadas lá já foram revisadas aqui no blog. Você só precisa visitar a página de índice em seu idioma preferido para encontrá-las.
Eu recomendo que você visite a homepage da Fundación Alpe e saiba mais sobre eles e o que eles fazem em favor da acondroplasia: http://www.fundacionalpe.org/en/.
Slide 2: Neste slide, há uma lista de medicamentos investigacionais que já estão sendo testados em ensaios clínicos. Embora o infigratinib ainda não tenha sido testado na acondroplasia, ele vem sendo utilizado em vários estudos clínicos para o câncer.
A coluna da direita "estimated launch" lista as previsões de aprovação atuais para os respectivos medicamentos, com base em informações publicadas sobre seu estágio atual de desenvolvimento e no meu conhecimento de processos regulatórios e de alguns padrões da estratégia da indústria farmacêutica para lançar novos medicamentos. Ambas as previsões para vosoritide e TA-46 estavam de acordo com o que seus desenvolvedores apresentaram mais tarde durante o congresso.
Vamos ver as estimativas para vosoritide (você pode extrapolar essas hipóteses para todos os outros medicamentos investigacionais):
O desenvolvedor está conduzindo o estudo de fase 3 com vosoritide agora, e eles dizem que os resultados estarão disponíveis até o final do próximo ano (2019). Com os resultados desse estudo em mãos (desde que o estudo seja bem sucedido), eles poderão requisitar a aprovação da droga a FDA. Geralmente, a aprovação levará de 3 a 6 meses, já em 2020. Creio que a aprovação na Europa virá logo depois da FDA, então ainda em 2020, seguida por outros mercados relevantes (Reino Unido, Austrália, Canadá, Suíça, talvez outros também, como o Japão).
Penso que as aprovações na América do Sul e outros países não centrais virão durante 2021 ou mais tarde, mas estas são apenas estimativas, já que a estratégia de submissão regulatória é definida pelo desenvolvedor!
Não creio que haverá dificuldades ao acesso ao medicamento uma vez aprovado nos principais mercados, desde que o sistema de saúde do país o adote. No entanto, isso pode se tornar um desafio em alguns países da UE, já que podemos prever que o custo do medicamento será alto (isso também é baseado em informações publicadas). A grande batalha será entre o desenvolvedor e clientes finais (na maior parte das vezes, sistemas de saúde pública dos países, ou governos). O desenvolvedor precisará mostrar que o custo do medicamento vale a pena, dado o benefício que ele pode oferecer.
Em cada país, as associações locais são fundamentais para que o tratamento seja disponibilizado mais rápido ou mais tardiamente, pois podem ser uma voz forte defendendo as famílias de crianças afetadas, mas vemos que em vários desses países ainda há dificuldades internas sobre definir se são a favor ou contra as terapias. Compare a maneira como o Alpe (Espanha) abraça a ideia de fornecer soluções para as novas gerações com alguns conceitos ainda defendidos por outras associações ao redor do mundo.
Mais do que as associações, as famílias são de extrema importância. Se a associação local não puder ou não quiser ajudar, as famílias devem se reunir e pressionar os sistemas de saúde de seus países pelas novas terapias.
Há outro aspecto a considerar: a primeira aprovação potencial para o vosoritide será apenas para crianças de 6 anos ou mais. É assim que funcionam os sistemas regulatórios. A aprovação potencial para crianças menores será concedida somente após o final do estudo da fase 2 que acaba de começar, mais tarde, em 2022-23, caso também demonstre eficácia e segurança nessa faixa etária.
Slides 4 e 5: Estatinas são medicamentos que vêm sendo usados há bastante tempo para reduzir o colesterol em indivíduos sob alto risco de doenças cardiovasculares, uma vez que o colesterol elevado tem sido implicado como mecanismo causal ou adjuvante para o desenvolvimento dessas doenças.
Recentemente, algumas estatinas foram testadas em um modelo murino de acondroplasia com resultados bastante positivos no resgate do crescimento ósseo. No entanto, há uma preocupação grande sobre o uso de estatinas em crianças porque o colesterol é uma molécula importante para a produção de hormônios e outras substâncias produzidas pelo organismo as quais são fundamentais para o desenvolvimento normal do corpo em crescimento.
Dessa forma, existe uma questão relevante quanto a expor crianças a uma medicação que poderia ser nociva: as estatinas são seguras em crianças?
Para responder a esta pergunta, vamos rever o que há de estudos na literatura. As estatinas têm sido utilizadas em crianças e adolescentes portadores de hipercolesterolemia familiar. Há estudos de médio prazo (alguns anos) mostrando que as estatinas utilizadas não causaram qualquer efeito nocivo relevante. O mesmo tem sido observado com as estatinas em diversos outros estudos em desordens genéticas em crianças e adolescentes (como as listadas no slide 5) e até em mulheres grávidas. Algumas das desordens da lista, tais como a neurofibromatose e a Síndrome de Noonan, compartilham de distúrbios metabólicos ósseos semelhantes aos que são verificados na acondroplasia.
Considerando a soma de todos os dados de segurança reportados por esses estudos, pode-se inferir que há evidência suficiente para autorizar um estudo clínico com estatinas em crianças com acondroplasia, pois elas têm demonstrado segurança nessa população. Para aprender mais sobre estatinas, visite este artigo do blog.
Slide 6: RBM-007 é uma pequena molécula desenvolvida para se ligar especificamente ao fator de crescimento de fibroblastos 2 (FGF2) e bloquear sua atividade. O FGF2 é um dos fatores ativadores de FGFRs mais amplamente distribuídos pelo corpo e é um importante ativador do FGFR3, depois do FGF18 e FGF9.
O desenvolvedor do anti-FGF2, Ribomic, lista a acondroplasia entre as indicações clínicas que estão sendo exploradas. Uma questão importante é sobre o risco de efeitos indesejáveis que poderiam surgir devido ao uso prolongado de uma medicação que poderia inibir atividades do FGF2 além daquelas esperadas em relação ao crescimento ósseo.
Slide 7: O processo que dirige o crescimento ósseo em crianças é muito complexo, e regido pela interação de dezenas de moléculas. Uma dessa moléculas é chamada de proteína (ou peptídeo) relacionada ao PTH (PTHrP). PTH é o hormônio da paratireóide e regula o metabolismo do cálcio nos ossos. O PTHrP é um dos principais estimuladores da proliferação de condrócitos na placa de crescimento.
Na acondroplasia, a superatividade do FGFR3 provoca uma redução do PTHrP, com claras consequências na capacidade dos condrócitos de proliferar, uma das marcas registradas da acondroplasia.
PTH e PTHrP são moléculas semelhantes e utilizam os mesmos receptores para exercer suas funções na cartilagem e no osso. Dessa forma, parece fazer sentido explorar o PTH no contexto da acondroplasia. Isto foi realizado em alguns estudos como o mostrado no slide 6. A utilização de um análogo do PTH em um modelo de acondroplasia resultou em evidente resgate do crescimento ósseo.
Uma questão relevante sobre o uso de PTH por período prolongado é sobre o risco do desenvolvimento de câncer ósseo devido ao estímulo prolongado da proliferação celular. Essa preocupação surgiu durante o processo de aprovação do teriparatide, um análogo do PTH, para o tratamento da osteoporose em adultos. Testes em animais com doses muitíssimo mais altas do que as doses aprovadas para tratamento resultaram em desenvolvimento de câncer ósseo. Desde a aprovação do teriparatide, um sistema de vigilância tem seguido usuários em todo o mundo e, até recentemente, nenhum caso de câncer ósseo que pudesse ser relacionado ao teriparatide havia sido relatado.
Outra questão é sobre se o uso de PTH para tratar a acondroplasia seria suficiente para resgatar e garantir crescimento ósseo próximo ao normal, já que o PTH somente interferiria em uma das fases de desenvolvimento (proliferação) dos condrócitos na placa de crescimento, e não teria ação sobre a outra importante fase pela qual essa células dirigem o crescimento ósseo, a fase de hipertrofia (ou maturação).
Slide 8: Das moléculas apresentadas até agora, o peptídeo P3 é a única que foi desenhada para especificamente bloquear a atividade do FGFR3. Somente por este dado, é a que potencialmente seria a mais eficaz e segura entre as que revimos até agora. A acondroplasia é causada pelo excesso de atividade de uma única enzima, o FGFR3, na cartilagem de crescimento, então faz sentido buscar soluções que possam bloquear ou inibir aquela superatividade para permitir que o osso possa seguir o programa de crescimento ósseo normal. O estudo apresentado no slide 8 mostra como a aplicação deste peptídeo resultou em significativo resgate do crescimento no modelo animal utilizado no estudo.
Há duas questões a serem respondidas sobre o peptídeo P3. A primeira é sobre o risco de efeitos indesejáveis associados ao bloqueio do FGFR3 em outros tecidos além da placa de crescimento. A segunda é sobre como garantir que o peptídeo P3 alcance a placa de crescimento antes de ser neutralizado pelos sistemas de "limpeza"naturais do organismo. Peptídeos são alvos de enzimas neutralizantes e usualmente não resistem muito tempo quando em seu estado livre. Dessa forma, para garantir que poderá circular por um tempo razoável para garantir que exercerá seu efeito, o peptídeo P3 provavelmente necessitará de um sistema de transporte para protegê-lo daquelas enzimas. Um desses transportes poderia ser o que está sendo desenvolvido pela Ascendis, com seu TransCon-CNP. Lembre-se, CNP também é um peptídeo.
Slide 9: Osteocrina é um peptídeo natural que tem a capacidade de se ligar a um dos três receptores de peptídeos natriuréticos (ANP, BNP e CNP), o NPRC. Apenas para recordar, o CNP é a molécula base para o vosoritide, o medicamento mais adiantado em estudos clínicos agora. O NPRC tem uma função de regulação no sistema dos peptídeos natriuréticos, impedindo que, por exemplo, o CNP exerça seus efeitos por tempo prolongado. Se, ao contrário, alguma outra molécula ocupa o NPRC, então o CNP fica com mais tempo para exercer suas funções no condrócito e estimular o crescimento ósseo.
Cientistas japoneses testaram exatamente este conceito em seu estudo mostrado no slide 9. Ao manter o nível de osteocrina alto em seu modelo animal, os pesquisadores verificaram um aumento da taxa de crescimento ósseo. Este é um estudo que demonstra mais uma potencial solução terapêutica para a acondroplasia e outras displasias ósseas.
Existem algumas questões a serem respondidas sobre o uso da osteocrina na acondroplasia. Primeiro, qual seria a consequência de bloquear o NPRC com a osteocrina em relação a ação dos outros peptídeos natriuréticos, ANP e BNP? Da mesma forma que com o peptídeo P3 (acima), como garantir que a osteocrina sobreviverá aos sistemas enzimáticos de "limpeza" do corpo. E finalmente, a osteocrina tem suas próprias ações no organismo. Quais seriam as consequências relacionadas ao seu uso como terapia para a acondroplasia?
Slides 10 e 11: A MK-4 é um dos subtipos de vitamina K-2. A vitamina K2 é importante na ativação de diversas proteínas que participam da regulação do cálcio nos ossos e nos vasos sanguíneos. A MK-4 tem sido utilizada de forma rotineira no Japão para o tratamento da osteoporose. A MK-4 parece exercer também algumas funções particulares em processos associados à proliferação celular e por isso foi testada em células de câncer de fígado. Nesse modelo, a MK-4 demonstrou inibir a proliferação celular através da inibição do FGFR3 (slide 10).
Pouco tempo depois desse artigo sobre câncer, um novo estudo foi publicado sobre os efeitos a longo prazo da MK-4 em animais jovens normais (slide 11). O que é relevante para nosso tema aqui é que nesse estudo os ratos que receberam MK-4 cresceram mais dos que os que receberam placebo ou vitamina K1. Escrevi aos autores desse estudo para verificar se eles teriam também examinado as placas de crescimento daqueles animais, mas infelizmente isso não foi feito.
Podemos imaginar o quão interessante seria encontrar uma molécula de baixo custo, cuja segurança está solidamente comprovada, com a capacidade de bloquear exatamente a enzima que está superativa na acondroplasia, o FGFR3. Mas para usar a MK-4, primeiro precisamos saber se ela funciona de fato. Ela precisa ser testada em um modelo de acondroplasia.
Slide 13: Kaempferol é um flavonóide parente do resveratrol, uma molécula muito conhecida e que tem sido pesquisada no contexto do processo de envelhecimento. O kaempferol está presente em muitas plantas e frutas. Como outros flavonóides, o Kaempferol tem atividades anti-oxidantes e anti-inflamatórias e neste contexto foi testado em um modelo de artrite reumatóide (AR). A AR é uma doença autoimune, em que o corpo produz anticorpos contra estruturas próprias, gerando um processo inflamatório crônico. Na AR, a inflamação continuada leva à destruição de articulações entre outras complicações clínicas. No estudo mostrado no slide 13, o kaempferol foi utilizado em um modelo de AR, no qual se demonstrou sua habilidade de inibir o FGFR3. Não podemos extrapolar os resultados desse estudo para a acondroplasia sem antes testar este flavonóide em um modelo apropriado. Aqui há mais uma oportunidade aberta para pesquisa e desenvolvimento de uma solução para a acondroplasia.
Slide 14: Significado da sigla CRISPR-Cas9 em inglês: CRISPR, Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats; Cas9: CRISPR associated protein 9. Não se preocupe com este nome complexo!
O que é importante saber é que este é um novo método que tem sido utilizado para modificar como um gene se manifesta (ou é expressado, como se diz no jargão científico). Com o CRISPR-Cas9, pode-se introduzir, modificar ou eliminar a expressão de genes. Há muita esperança que este método possa ser utilizado no tratamento de muitas doenças que afligem o homem, animais e plantas. Dado o seu imenso potencial, esse sistema de edição genética também provoca discussões no campo ético.
De toda forma, o CRISPR-Cas9 pode ser utilizado para regular a expressão de genes que, quando desregulados, causam problemas clínicos, como é o caso na acondroplasia. De fato, esse sistema foi explorado no estudo listado no slide 14, em que os pesquisadores conseguiram eliminar a expressão do FGFR3 mutante em células de um indivíduo adulto com acondroplasia.
Este estudo é tão somente uma prova-de-conceito. Há muitas questões que precisam de respostas antes de que uma terapia para acondroplasia baseada em CRISPR-Cas9 possa ser considerada viável. No entanto, aqui está mais uma avenida a ser explorada. Se for possível impedir que o gene mutante se manifeste, pode-se esperar que crianças afetadas possam se desenvolver normalmente e não apresentem ou tenham um risco muito menor de apresentar as frequentes complicações clínicas que acompanham a acondroplasia.
Slide 15: Qualquer que seja a terapia escolhida, desenvolvedores de medicações precisam estar atentos a um conceito fundamental.
- TEMPO
Desta forma, toda pesquisa clínica dirigida para a acondroplasia ou outras desordens genéticas com características semelhantes precisa ser direcionada para atender três itens CERTOS (the three RIGHTS):
1. O desenho certo de estudo clínico.
Reguladores têm solicitado que os estudos de comprovação de eficácia das drogas para acondroplasia utilizem desenhos que incluem a utilização de placebo como comparador, como uma forma de reduzir o risco de viés de interpretação de resultados obtidos. Conquanto o uso de placebo em estudos clínicos é um método apropriado em caso de doenças de alta prevalência, utilizá-lo no contexto das doenças raras e, em especial naquelas situações em que a potencial medicação só poderá oferecer benefícios clínicos por um período limitado de tempo, como é o caso da acondroplasia, levanta questões éticas (já discutidas nesse blog).
Há desenhos de estudo clínicos alternativos que ao mesmo tempo em que defendem os participantes, reduzem o risco de viés de interpretação de resultados. Eles estão listados no documento básico que guia a pesquisa clínica atual no mundo (ICH). Entre eles, está o desenho em que se compara um determinado marcador antes da intervenção (o uso do medicamento do estudo) com depois do marcador. Curiosamente, as agências regulatórias têm solicitado que os desenvolvedores de medicamentos para acondroplasia conduzam esses estudos antes de iniciar o estudo com sua medicação. São os chamados estudos de "história natural". No entanto, como exemplo recente, ao definir os requerimentos para o desenho do estudo de fase 3 do vosoritide, a FDA solicitou que o estudo fosse controlado com placebo (maio 2018). O mesmo desenho foi aplicado no estudo de fase 2 com bebês e crianças menores de 5 anos, também em andamento. Assim, na verdade, o estudo de história natural que precede o estudo com medicação perde muito de seu valor como comparador, aumenta a carga emocional sobre famílias e pacientes e os custos de desenvolvimento de medicações.
2. A população certa a ser estudada.
Testar medicações para crescimento em crianças mais velhas ou adolescentes é pedir para que os resultados sejam menos do que apropriados. Reguladores têm solicitado que estudos comecem em crianças maiores antes de que as menores possam ser testadas. Dois argumentos são usados aqui e eles se inter-relacionam: segurança e ética. A segurança da droga em estudo precisa antes ser testada em crianças mais velhas antes de ser fornecida às mais novas porque não seria ético fazê-lo na ordem inversa. A este argumento, pergunto: do ponto de vista ético, qual a diferença entre uma criança de um ano e outra de cinco anos? Em que situação uma é mais vulnerável do que a outra? Para mim, ambas necessitam da mesma proteção no contexto de um estudo clínico.
Com anos de crescimento já decorridos, pode-se esperar um risco bem mais elevado de que uma medicação para acondroplasia fracasse por não alcançar os objetivos previstos, quaisquer que sejam, porque a droga foi testada em uma população que desde o princípio poderia não responder melhor ao tratamento em teste. Há exemplos na literatura recente sobre este tipo de situação (pesquise por Distrofia Muscular de Duchenne e drisarpersen e eteplirsen).
3. Os objetivos certos.
Estudos clínicos são realizados como parte de um plano de desenvolvimento de uma potencial nova medicação para uma doença ou condição clínica. O tempo de desenvolvimento de medicações sofre muita pressão de várias fontes, desde o tempo de validade da patente da nova potencial droga até a competição com outras moléculas em pesquisa, passando por questões que às vezes são inerentes à indicação clínica que está sendo estudada.
Por isso, é importante que o desenho de um estudo clínico contemple objetivos que possam ser verificados e confirmados dentro de um período limitado de tempo, um intervalo que ao mesmo tempo permita determinar que a medicação é segura e eficaz. Escolher o objetivo, ou objetivos certos, é fundamental para aumentar a chance de sucesso de uma nova medicação clínica. No caso da acondroplasia, há vários desfechos que podem ser pesquisados, no entanto um número significativo deles só poderá ser verificado ao fim de muitos anos de acompanhamento de indivíduos expostos àquela medicação. Como exemplo, a apneia do sono é um complicação frequente em crianças com acondroplasia. No entanto, como verificar, em um prazo razoável de tempo, que uma medicação poderá interferir nessa complicação clínica. Assim, parece razoável que velocidade de crescimento, crescimento total, mudanças na desproporção de membros e outros desfechos similares sejam escolhas mais apropriadas como objetivos clínicos de eficácia do que outros que só poderão ser verificados em longo prazo.