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Tuesday, March 15, 2016

Bloqueando a produção do FGFR3 para tratar a acondroplasia (parte 1)

Introdução

O blog tem atualmente 24 seguidores (é o que Google diz ...). Esses resilientes leitores provavelmente pensam que eu repito demais a mesma informação, pois os artigos muitas vezes começam com conceitos básicos sobre a acondroplasia antes de entrar no assunto. Isso é verdade, mas eu sei que às vezes outros visitantes passam por aqui, então é bom tentar colocar todos no mesmo passo. E, afinal de contas, sempre procuro incluir algo novo nessas introduções (e isso é verdade nesta aqui, também!).

Lendo novamente os artigos mais recentes, percebo que a linguagem e explicações, por vezes, podem parecer difíceis de entender para o leitor de primeira viagem. Se você acha que está sendo difícil entender alguns dos temas comentados aqui, dê uma olhada nos primeiros artigos do blog, escritos em 2012. Eles podem ajudar a trafegar mais facilmente através dos novos. Por exemplo, o tema deste artigo foi revisto em três artigos de 2012:

24/01/2012. Mirando na produção do FGFR3 para resgatar o crescimento ósseo na acondroplasia
12/02/2012. O mundo do RNA: desligando o FGFR3 na acondroplasia 

20/02/2012. O mundo do RNA: desligando o FGFR3 na acondroplasia, parte 2

E, em 2013, escrevi um outro artigo sobre este assunto:

18/06/2013. Interferindo na produção do FGFR3: uma potencial estratégia para tratar a acondroplasia


Pode ser útil você lê-los antes de continuar aqui, porque o tema tem suas complexidades.

Algumas informações básicas

A acondroplasia é causada por uma mutação no gene FGFR3, o qual codifica a (contem as instruções para a produção de) proteína chamada receptor de fator de crescimento de fibroblastos 3 (FGFR3) (1,2). O FGFR3 tem um papel fundamental no desenvolvimento ósseo, que é o de reduzir a velocidade de crescimento do osso (3). Ele funciona como um freio no interior das estreitas regiões localizadas em ambas as extremidades dos ossos longos chamadas de placas de crescimento (Figura 1). As placas de crescimento são as estruturas responsáveis ​​pelo alongamento dos ossos tubulares (ou longos). As células no interior da placa de crescimento, os condrócitos, são responsáveis pelo crescimento do osso através de um processo muito complexo, e o FGFR3 é parte dele.

Figura 1. A placa de crescimento.


 

Nas Figuras 1 e 2 você pode ver que os condrócitos da placa de crescimento são posicionados de uma forma que, sob estímulo contínuo de muitos agentes de crescimento ativos (FGFR3 incluído), partem de um estado de repouso (resting zone), passam por um organizado frenesi proliferativo (proliferative zone), são submetidos a um aumento maciço de volume (hypertrophic zone) e, finalmente, dão lugar às células responsáveis ​​pela construção do novo osso, os osteoblastos. Como um pequeno detalhe, alguns autores em revisões recentes têm considerado que o tamanho da zona hipertrófica é determinante para o alongamento do osso (4).

Figura 2. O ciclo de vida dos condrócitos e muitos dos agentes que participam no desenvolvimento do crescimento ósseo.



Como mencionado acima, o FGFR3 atua para equilibrar o efeito de vários outros agentes que estimulam a proliferação de condrócitos. Se não houvesse FGFR3, os ossos cresceriam excessivamente causando problemas de saúde, como vemos em casos relatados na literatura (5).

No entanto, na acondroplasia, a mutação no gene FGFR3 faz o FGFR3 ficar mais ativo do que o normal, o que por sua vez leva à interrupção do crescimento do osso. Sob o efeito de um FGFR3 superativo, condrócitos reduzem sua taxa de proliferação e menos deles sofrem hipertrofia (Figura 3). Com menos condrócitos amadurecendo e crescendo, a zona hipertrófica não atinge o seu pleno potencial e temos comprometimento do crescimento ósseo. Basicamente, quase todas as características clínicas e consequências para a saúde na acondroplasia podem ser explicadas por este mecanismo (4).

Figura 3. Placas de crescimento de um modelo de rato com acondroplasia (direita) e de um animal não afetado (à esquerda).


Compare os comprimentos das zonas proliferativas (PZ) e hipertroficas (HZ) entre as placas de crescimento normal e afetada. Adaptado e reproduzido aqui de Yingcai W et al. PNAS 1999;96:4455-60, somente para fins educativos.
A atividade do FGFR3 depende de sinais que vêm de fora dos condrócitos. Na Figura 4 você pode ver que o FGFR3 é como uma antena de TV, colocada no telhado da casa (membrana celular). Ele recebe sinais químicos trazidos por fatores de crescimento de fibroblastos (FGFs) que circulam na proximidade dos condrócitos, no interior da placa de crescimento. Quando um FGF liga a antena, um sinal químico atravessa o corpo da antena (o corpo do FGFR3) e aciona várias outras cascatas químicas no interior dos condrócitos (6). Digamos que é o FGFR3 ativo "apertando botões no painel de controle da célula".

Figura 4. As cascatas químicas intracelulares do FGFR3 (da Nature Reviews Cancer 2005).



Os cientistas têm agora uma boa compreensão de como o FGFR3 exerce a sua ação nos condrócitos, os "botões" que aperta para fazer os condrócitos pararem de crescer, embora não raro tragam mais detalhes para este processo.

Aprender sobre o mecanismo de ação das proteínas, tais como o FGFR3, é como criar um mapa com estradas destacando seus cruzamentos, pontos de checagem, estações de trem etc. Esse mapeamento permite que os pesquisadores trabalhem em soluções para superar a falta ou excesso de atividade dessas proteínas. Muitas terapias atuais para um grande número de doenças têm sido criadas com a ajuda desses mapas, uma vez que ajudam a encontrar os alvos corretos para combater uma determinada condição médica.

Pensando em terapias para a acondroplasia, como também para outras muitas doenças genéticas causadas por uma única proteína hiperativa, o movimento natural é o de encontrar um agente que possa interromper essa proteína de exercer a sua função. Teoricamente, isso poderia ajudar a reverter ou minimizar os seus efeitos.

Pode-se conseguir interromper a ação do FGFR3 por várias vias diferentes (olhe as "estações de trem" no mapa da cascata de sinalização na Figura 3), desde bloquear a recepção do sinal pela antena ou pelo bloqueio dos botões no painel de controle até o de contrabalançar o efeito de uma daquelas cascatas químicas, através do estímulo de uma cascata antagonista.

A maioria dessas estratégias já foi revista aqui no blog. Por exemplo, você pode bloquear a antena com anticorpos concebidos para conectarem-se a ela. Existem pelo menos três anticorpos contra o FGFR3 publicados na literatura, os quais têm sido explorados em estudos clínicos para o câncer ativado por FGFR3 (veja este artigo).

Você pode bloquear os botões no painel de controle com pequenas moléculas chamadas inibidores de tirosina quinase (TKI). Há muitos TKI disponíveis, mas até agora nenhum bom o suficiente para ser usado na acondroplasia (veja este artigo). E você também pode estimular outra antena da célula (outro receptor) para reduzir a atividade do FGFR3, como observamos com o vosoritide, um análogo do peptídeo natriurético tipo C (CNP), atualmente em um estudo clínico de fase 2 para a acondroplasia.O vosoritide imita o CNP ao se ligar ao seu receptor localizado na membrana celular do condrócito (como o FGFR3). O receptor é ativado e sua sinalização intercepta a MAPK, a principal cascata de sinalização do FGFR3, inibindo-a ao nível da "estação de trem" RAF (Figura 5) (veja este artigo).

Figura 5. A cascata de sinalização do CNP intercepta a cascata MAPK desencadeada pelo FGFR3.


Matsushita M et al. (2013). PLoS ONE 8 (12): e81569. Reproduzido aqui apenas para fins ilustrativos


Estes são apenas alguns exemplos entre outras diversas estratégias que já estão sendo exploradas para a acondroplasia (veja este artigo). No entanto, há outros tipos de abordagem que poderiam ser adequadas para controlar ou regular o FGFR3 e, depois desta longa introdução, vamos falar sobre uma delas, que seria a de bloquear a produção do FGFR3 (está no título, não é?). Na verdade, já a revisamos aqui no blog (os artigos noa no topo deste texto!, você chegou a lê-los?), Mas como há nova informação chegando, pensei que valeria a pena falar sobre ela novamente. Afinal, essa estratégia poderá nos ajudar a entrar em outra nova estratégia potencial que também lida com DNA, RNA e a maquinaria de transcrição de genes mais adiante.

Regulando o regulador

Como você deve saber, nosso DNA é uma espécie de cofre onde a informação química necessária para criar as proteínas fundamentais para o nosso corpo é armazenado. A vida é um processo dinâmico e existe sempre a necessidade de produzir novas proteínas de modo que as células, tecidos e o corpo como um todo possam funcionar normalmente (Animação 1, Inglês, 2:41min).

Animação 1. Do DNA à proteína (yourgenome.org).




A forma como o processo pelo qual o DNA é "lido" e "copiado" para gerar proteínas frequentemente pode conduzir a estados em que um determinado gene que codifica a informação para gerar uma proteína poderia ficar longamente "aberto" para ser "lido", de modo que a proteína poderia ser produzida sem parar. Isto, por sua vez, pode resultar em problemas de saúde. Por exemplo, alguns tipos de células cancerosas, como no câncer de mama, são capazes de iniciar a superprodução de "antenas", tais como o nosso FGFR3, para captar mais sinais externos
em circulação que estimulam ainda mais o crescimento do câncer.

Em condições normais, este excesso de produção de proteínas não ocorre porque a célula tem várias medidas de controle de qualidade que funcionam para regular este processo. Uma delas é constituída por moléculas de RNA.

Mas, vamos devagar aqui, passo a passo. Lembro-me que, nos meus tempos de colégio, quando comecei a estudar biologia celular, havia três tipos clássicos de RNA: RNA mensageiro (mRNA), o RNA de transferência (tRNA) e o RNA ribossomal (todos eles aparecem na animação acima). Bem, desde então, a lista de tipos de RNA não parou de crescer. Dê uma olhada nesta página da Wikipedia (em inglês) para obter uma lista de tipos de RNA já identificados.

Algumas destas moléculas de RNA estão
muito envolvidas no processo de controle da produção de proteínas e o foco aqui é a família microRNA, ou simplesmente miRNA (revisto nos artigos mencionados acima). Demonstrou-se que essas moléculas de RNA controlam a quantidade de proteínas produzidas pela célula. Convido você a assistir à Animação 2 (Inglês, 4:53min) por Katarina Petsche, a qual dá uma visão global da síntese do miRNA e de como ele funciona:

Animação 2. A síntese e mecanismo de ação do miRNA (por Katarina Petsche).





Basicamente, devido à capacidade de degradação de mRNAs, os miRNAs têm sido classificados como moléculas "silenciadoras de genes". Como a proteína-alvo não é produzida, é como se o gene não estivesse funcionando (ou desligado, silenciado).

Há milhares de miRNAs
diferentes e cada um deles foi concebido para se ligar a um número limitado de mRNAs. Já se identificou vários miRNAs, tais como o miRNA-100 (ou miR-100), que se ligam ao mRNA do FGFR3, mas aqui temos um problema. Embora os miRNAs sejam muito específicos para os seus alvos, seus alvos não são únicos. Quando você pensa em "silenciamento" de um gene específico, digamos o FGFR3 na acondroplasia, não quer "silenciar" outros genes-alvo, uma vez que isso poderia levar a outros problemas de saúde.

Entre os vários miRNAs que mostraram exercer uma função de controle sobre o FGFR3, o miR-100 parece ser um dos mais relevantes, uma vez que há evidências de que ele realmente controla o FGFR3. Diversos estudos publicados recentemente exploraram a ligação entre o miR-100 e o FGFR3 no câncer pancreático (7), glioblastoma (8), sarcoma (9) e em células de
câncer de pulmão (10) e mostraram que, nas células que "superproduzem" miR-100 havia menos FGFR3 disponível e vice-versa, e todos concluíram que o miR-100 foi capaz de inibir o crescimento do câncer nas suas experiências. Não se sinta confuso sobre o fato de que o FGFR3 é usado pelas células cancerosas paraa crescer. Isso acontece porque o FGFR3 é um freio somente para os condrócitos da placa de crescimento; em outras células ele funciona como um acelerador ... Estes tipos de descobertas podem conduzir ao desenvolvimento de uma estratégia de estímulo de expressão (de produção) de miR-100 nas células de câncer que utilizam o FGFR3 para crescer, para silenciar o gene FGFR3 e combater o tumor.

Então, se uma abordagem como essa poderia ser usada para o tratamento do
câncer, o miR-100 ou outros miRNAs são adequados para tratar a acondroplasia?

Provavelmente não, porque, embora exista evidência de que eles inibem o FGFR3, também existem outras proteínas que podem ser afetadas por suas ações, o que poderia trazer problemas indesejáveis. Em resumo, miRNAs não são suficientemente específicos.

Bem, então, qual é o objetivo desta revisão? A coisa é que os pesquisadores foram capazes de criar, em laboratório, um outro tipo de RNA que faz basicamente o mesmo que que os miRNAs (aprender um pouco sobre um, é aprender sobre o outro...). No entanto, há uma diferença importante: como é sintetizado no laboratório, provavelmente terá
especificidade muito maior para o FGFR3. Esta molécula de RNA sintética é chamada de pequeno RNA de interferência (small interference RNA) ou simplesmente siRNA. Estudos já realizados mostram que siRNAs usam a mesma maquinaria celular e causam efeitos similares aos dos miRNAs (11). Os investigadores têm de introduzir o siRNA no interior da célula e depois ele funciona como um miRNA. Hoje em dia, uma abordagem "simples" para provar que um gene é ligado a uma determinada função é a de aplicar um siRNA específico e observar os efeitos de silenciamento daquele gene. Por exemplo, isso foi feito em diversos contextos de doenças (11) e também na acondroplasia, em um estudo realizado por Pintor e Legeai-Mallet (12).

Se você leu o artigo de 2013 sobre RNAs você já sabe que pelo menos uma empresa de biotecnologia com sede nos EUA (Marina Biotech) patenteou uma estratégia de interferência de RNA como possivelemtne útil para o tratamento de acondroplasia (13). Agora, descobri uma outra patente para o uso de moléculas de ácidos nucleicos para tratar a acondroplasia (14) (Santaris Pharma, Roche), então parece que tem havido algumas tentativas
recentes para atingir o FGFR3 na acondroplasia usando a estratégia siRNA.

Não sabemos se estas abordagens chegarão ao desenvolvimento clínico porque um dos principais desafios para as terapias à base de ácidos nucleicos (RNA é composto por ácidos nucleicos, como você sabe) é como fazer esses agentes atingirem os seus objetivos. Como as moléculas de RNA são tão poderosas, o corpo tem um grande número de agentes de proteção para garantir que essas moléculas não trafegarão livremente por muito tempo. RNA é o código genético de muitos vírus causadores de doença, e o corpo deve estar pronto para se livrar de ácidos nucleicos estranhos para se defender de infecções. Portanto, as moléculas de RNA tendem a ser rapidamente degradados por enzimas neutralizantes, e isto poderia explicar em parte por que não vemos progressos rápidos nesta área. Para a acondroplasia, o desafio é ainda maior porque as células-alvo, os condrócitos, estão em um ambiente muito bem protegido, a cartilagem da placa de crescimento, um lugar difícil de alcançar (ver este artigo anterior do blog).

Entregando a encomenda

A entrega a domicílio é realmente um desafio, e por esta razão usei o verbo "introduzir" quando eu descrevi o uso do siRNA três parágrafos acima. Não é fácil fazer moléculas de RNA chegarem ao interior das células, você precisa usar um táxi (o que se chama de transportador, vetor etc.) ou um disfarce. Por exemplo, em vários estudos foram aplicados apêndices na molécula de RNA, o que as tornou mais estáveis ​​e resistentes à neutralização por enzimas. Em doenças em que a célula alvo está num tecido com fluxo direto de sangue, isto pode ser suficiente para permitir que o siRNA entre na célula, mas em um tecido, tal como a placa de crescimento, onde não existe um fluxo sanguíneo direto, como isso pode ser alcançado?

Esta não é uma questão trivial. Uma estratégia possível para fazer uma droga chegar ao seu alvo é encontrar algo que somente esse alvo tem (como um marcador), o que não é uma tarefa fácil, mas ainda assim viável. No caso
dos condrócitos da placa de crescimento possivelmente um destes marcadores é um receptor de células (outra antena) chamado CD44. O problema aqui é que o CD44 é expresso por muitas células diferentes. Então, é inútil? Talvez não, porque a maioria das células que possuem CD44 não expressam FGFR3 em um nível significativo, de modo algum influência de um siRNA contra o FGFR3 nelas possivelmente não iria causar qualquer problema. A ideia seria anexar ou cobrir a molécula de RNA a uma outra molécula que pode ligar-se ao CD44. Uma vez ligado, o sistema celular que mantem o equilíbrio das antenas traria este CD44 ocupado para o interior da célula, onde o siRNA seria liberado para encontrar o seu alvo e exercer a sua função esperada. Esta é apenas uma ideia pessoal, nunca encontrei qualquer trabalho que explorasse esta abordagem nesta área específica.

Conclusão

Pode parecer que esta revisão não ajudou muito em termos de trazer uma nova terapia potencial espetacular para acondroplasia. Seria mais como uma revisão geral da doença, uma vez que o blog já tem artigos sobre miRNAs e siRNAs. No entanto, não estamos perdendo tempo: os processos
brevemente mencionados aqui servirão para ajudar-nos a viajar por um ainda mais complexo, que é a edição de genes, uma estratégia terapêutica potencial que está sob os holofotes agora.

Poderia ser usada para tratar a acondroplasia?

Pelo que eu já aprendi, diria que sim, mas vamos ver no próximo artigo. Ainda estou estudando este tópico ...


Referências


1.Bellus GA et al. Achondroplasia is defined by recurrent G380R mutations of FGFR3. Am J Hum Genet 1995;56(2):368-73. Free access.

2.Rousseau F et al. Mutations in the gene encoding fibroblast growth factor receptor-3 in
achondroplasia. Nature 1994;371(6494):252-4. Free access.

3. Laederich MB and Horton WA. FGFR3 targeting strategies for achondroplasia.Expert Rev Mol Med 2012;14:e11.

4. Narayana J and Horton WA. FGFR3 biology and skeletal disease. Connect Tissue Res 2015;56(6):427-33.

5. Makrythanasis P et al. A novel homozygous mutation in FGFR3 causes tall stature, severe lateral tibial deviation, scoliosis, hearing impairment, camptodactyly, and arachnodactyly. Hum Mutat 2014;35(8):959-63.

6. Ornitz DM and Marie PJ. Fibroblast growth factor signaling in skeletal development and disease. Genes Dev. 2015 Jul 15;29(14):1463-86. Free access.7. Li Z et al. MicroRNA-100 regulates pancreatic cancer cells growth and sensitivity to chemotherapy through targeting FGFR3. Tumour Biol 2014;35(12):11751-9.

8. Luan Y et al. Overexpression of miR-100 inhibits cell proliferation, migration, and chemosensitivity in human glioblastoma through FGFR3. Onco Targets Ther 2015;8: 3391-400. Free access.

9. Bi Y et al. Overexpression of miR-100 inhibits growth of osteosarcoma through FGFR3.Tumour Biol 2015;36(11):8405-11.

10. Luo J et al. Overexpression of miR-100 inhibits cancer growth, migration, and chemosensitivity in human NSCLC cells through fibroblast growth factor receptor 3.Tumour Biol 2015; published online Aug 28. DOI 10.1007/s13277-015-3850-z.


11.
Videira M et al. Preclinical development of siRNA therapeutics: towards the match between fundamental science and engineered systems.Nanomedicine 2014;10(4):689-702.

12
. Guzman-Aránguez A, Legeai‐Mallet L, Pintor J. Fibroblast growth factor receptor 3 inhibition by small interfering RNAs in achondroplasia. Anales Real Acad Nac Farm 2011; 77(1).


13Marina Biotech Patent WO 2011139842 A2. Nucleic acid compounds for inhibiting fgfr3 gene expression and uses thereof.


14. Santaris Pharma WO 2014080004 A1. Compositions and methods for modulation of fgfr3 expression.

Thursday, January 7, 2016

FGFR4: um problema para as potenciais estratégias de tratamento da acondroplasia com armadilhas de ligantes?



Introdução

Alguém interessado em aprender sobre o mecanismo de crescimento ósseo logo descobre que o processo através do qual os ossos se desenvolvem é incrivelmente complexo. A maioria dos nossos ossos não começa como tecido ósseo, mas como estruturas ou andaimes de cartilagem que, depois de uma série muito sofisticada de passos, são substituídas pelo osso definitivo, em um processo contínuo que dura até ao final da puberdade, quando a base de cartilagem desaparece. Ao pensar sobre o desenvolvimento dos ossos, é preciso ter em mente que, embora já tenhamos bastante conhecimento sobre o processo, ainda estamos apenas no início de compreender todos os fenômenos biológicos que ocorrem no interior dos ossos. Assim, não é surpreendente que dia sim, dia não novas peças do quebra-cabeça são trazidas pela ciência, desafiando esse conhecimento, reforçando o que Albert Einstein disse uma vez:


Nós ainda não sabemos um milésimo de um por cento do que a natureza nos revelou.

Estive pensando nisso depois de ler um interessante estudo sobre os efeitos do receptor de fator de crescimento de fibroblastos 4 (FGFR4) sobre o crescimento ósseo (1). O FGFR4 é um irmão do FGFR3, a enzima que, quando mutada, causa a acondroplasia. Bem, temos uma nova peça do quebra-cabeça? Acho que vale a pena fazer uma breve revisão desse estudo porque ele pode trazer algumas implicações para algumas das novas terapias potenciais para a acondroplasia. Mas, vamos começar devagar para colocar os resultados desse estudo em contexto.

O intrincado processo de crescimento ósseo


Com algumas poucas exceções, nossos ossos crescem a partir de pequenas regiões localizadas em suas extremidades, chamadas de placas de crescimento (Figura 1). Dentro das placas de crescimento vivem as células que lideram o processo de crescimento, os condrócitos.

Figura 1. Diagrama da placa de crescimento com as várias camadas de condrócitos.


O condrócito é o "chefe", mas ao mesmo tempo tem que realizar muitas instruções químicas em paralelo ou seriais dadas por dezenas de agentes de crescimento locais e sistêmicos, que por sua vez podem funcionar ou como promotores ou supressores de crescimento (Figura 2). Os condrócitos, obedecendo a esses diversos agentes locais e sistêmicos, passam por uma série de transformações que podem ser facilmente detectadas ao microscópio (Figura 1), começando a partir de células pequenas, em repouso (resting zone), passando por uma fase de elevada taxa proliferativa (zona proliferativa), para um estado em que eles sofrem um impressionante aumento do seu volume celular, quando são chamados de condrócitos hipertrofiados (Figura 1). Esta última fase é considerada como a principal responsável pelo crescimento ósseo.

Figura 2. Alguns dos fatores de crescimento que regulam o desenvolvimento da placa de crescimento (2).

Extraído de Kozhemyakina E et al. A pathway to bone: signaling molecules and transcription factors involved in chondrocyte development and maturation. Development 2015;142(5):817-31. Acesso livre. Reproduzido aqui apenas para fins educacionais.

A cascata FGF / FGFR

Um dos processos químicos que regem o crescimento ósseo é fornecido pelo que chamamos de cascata (ou via) de sinalização do fator de crescimento de fibroblastos (FGF) / receptor do fator de crescimento de fibroblastos (FGFR), que é familiar para quem está interessado em acondroplasia. A família dos FGFs é composta por 23 fatores de crescimento diferentes, e a família dos FGFR tem quatro enzimas irmãs (e uma nova, candidata a se tornar a quinta) (3). Aqui, focamos no crescimento dos ossos longos, então não vou mencionar todas as atividades que o eixo FGF / FGFR têm no corpo e nos poucos ossos que crescem pelo que é chamado de processo intramembranoso.



Para ajudar a entender o que é a cascata de sinalização, você pode rever outros artigos relacionados do blog (consulte a página Português na barra acima). Em resumo, como em uma série de blocos de dominó, uma ligação química inicia outra, que ativa uma terceira, e essa uma quarta, em uma cadeia de reações químicas. Essas cascatas de sinalização fornecem instruções aos condrócitos para como eles devem reagir a cada um dos estímulos recebidos. FGFs são chamados de ligantes, porque iniciam a cascata química ao se ligarem com a molécula receptora, um dos FGFRs.

Embora o número de FGFs seja grande, apenas alguns têm participação mais intensa no processo de crescimento dos ossos longos. Cientistas identificaram até agora o FGF9 e o FGF18 como os com mais influência sobre os condrócitos da placa de crescimento (3-5).

Depois de décadas de sua descrição, pesquisadores já identificaram as principais funções dos três primeiros FGFRs no crescimento ósseo. O FGFR4 não tem, até o momento, sido reconhecido como relevante para este processo. Veja a Tabela 1, extraída de uma recente revisão dos Drs. David Ornitz e Nobuyuki Itoh (3), que lista os efeitos da ablação dos FGFRs em modelos genéticos. Você verá que os modelos que exploraram a ablação ou mutações com perda de função do FGFR4 não mostraram consequências na placa de crescimento. Mais do que isso, parece que o FGFR4 é mais ligado a processos metabólicos, incluindo os da vitamina D e do fosfato, que são cruciais para o desenvolvimento e saúde óssea, mas de uma forma redundante com outros FGFRs.


Tabela 1. Efeitos da inibição genética (perda de função) dos FGFRs

 
O FGFR4 é relevante para o crescimento ósseo?


É por isso que o estudo recente de Cinque et al. (1) é interessante. Os investigadores trabalharam no papel do FGFR4 no crescimento do osso em diversos modelos celulares e animais e terminaram por encontrar que o bloqueio da sinalização do FGFR4 provoca perturbações no crescimento do osso por interferir em um mecanismo que faz parte do equilíbrio normal das células em tecidos, chamado autofagia.

No seu estudo, a autofagia foi ligada ao circuito de modulação do colágeno 2, que é o componente principal da matriz da cartilagem. Não quero tornar este texto mais complexo do que já é. Basta entender que o colágeno 2 é muito importante para a expansão da placa de crescimento e, consequentemente, do osso. Se existe menos colágeno 2 na matriz cartilaginosa, o processo de crescimento é prejudicado.

O efeito de inibição da FGFR4 parece ser especialmente observado em condrócitos mais maduros (pré-hipertrofia / hipertrofia; ver acima). A ausência de sinalização do FGFR4 levaria a placas de crescimento mais finas, e assim a ossos mais curtos. Mais importante, os pesquisadores descobriram que o FGF com mais influência sobre o FGFR4 é o FGF18. Quando o FGF18 ativa o FGFR4, desencadeia as reações químicas no interior dos condrócitos que regulam a expressão (produção) de colágeno 2, permitindo a expansão normal da zona hipertrófica. Tanto a deficiência de FGF18 quanto a inibição do FGFR4 levou à perturbação do processo de autofagia.

Bem, isso parece estranho

Estes resultados são um pouco surpreendentes, porque, como vimos, estudos anteriores falharam em mostrar problemas específicos causados ​​pela ablação de FGFR4 nos ossos. Então, como vamos lidar com esta nova informação? Em primeiro lugar, podemos perguntar como os pesquisadores em estudos anteriores avaliaram as alterações causadas pela inibição da FGFR4 nas placas de crescimento. Talvez eles nem tenham acessado esse processo específico nas placas de crescimento, ou eles usaram diferentes técnicas, ou as técnicas disponíveis então, não eram sensíveis o suficiente para detectar qualquer consequência relevante com a inibição desta enzima. Em segundo lugar, seria interessante ver se os resultados obtidos por Cinque et al. (1) são reproduzíveis. Às vezes, experiências não podem ser reproduzidas e as conclusões iniciais são reconhecidas como falhas. No entanto, neste caso, os investigadores parecem ter repetido os testes com técnicas diferentes e terminaram por encontrar basicamente os mesmos resultados. No entanto, eles admitem que outros estudos devem ser realizados para melhor compreender o papel do FGFR4 no desenvolvimento ósseo.

E por que estes resultados são um pouco preocupantes quando se pensa em tratamentos para a acondroplasia? Que tipo de perguntas estes novos dados trariam afinal de contas?

Um problema para as estratégias de armadilhas de ligante (ligand trap)?


O fato é que nós sabemos que o FGF18 é um dos ativadores mais relevantes do FGFR3 na placa de crescimento. A ativação do FGFR3 por si só não é um problema, em condições normais: os ossos precisam do FGFR3 para regular sua velocidade de crescimento. No entanto, quando o FGFR3 está mutado como na acondroplasia, qualquer ativação contribui para o bloqueio do crescimento visto nesta displasia esquelética. Uma das abordagens que estão sendo exploradas para tratar eficientemente a acondroplasia é exatamente a de bloquear a ativação do FGFR3, e existem várias potenciais estratégias visando esse objetivo. Temos acompanhado com grande interesse o desenvolvimento das chamadas armadilhas de ligante (ligand traps; (6-8); ler este artigo anterior do blog). Particularmente, o estudo pelo grupo liderado pela Dr. Gouze (6) mostrou resultados significativos sobre o resgate de crescimento do osso usando uma versão solúvel (livre) do FGFR3. O grupo da Dr. Gouze apresentou resultados tão impressionantes com sua abordagem em um modelo de rato (Figura 3) que o sFGFR3 está agora em desenvolvimento sério visando potenciais ensaios clínicos no futuro (9).


Figura 3. Efeito da armadilha de ligante sFGFR3 em um modelo animal de acondroplasia (6).


O conceito da armadilha de ligante para acondroplasia é bastante simples. Com uma forma livre de FGFR3 circulando dentro da placa de crescimento, provocaríamos uma "competição" entre esta versão livre e a que fica ancorada nos condrócitos (aquela que faz o condrócito parar de crescer na acondroplasia) para se ligar aos FGFs locais (principalmente FGFs 9 e 18), resultando em "aprisionamento" destes FGFs pela forma solúvel e em menos ativação dos FGFR3 presos aos condrócitos. Se estes não são ativados, exerceriam menos atividade e o crescimento ósseo não seria tão prejudicado como vemos na acondroplasia. A imagem acima (Figura 3) nos leva a pensar que a estratégia da armadilha de ligante é promissora.

No entanto, essas armadilhas de ligante visam principalmente o FGF9 e o FGF18 (e possivelmente FGF2). Levando-se em conta que o FGF18 seria capturado pelas armadilhas, haveria menos ativação do FGFR3 (que é o que queremos, pensando na acondroplasia), mas também poderia haver consequências ao se ter menos FGF18 ativando o FGFR4. Entende?

O FGF18 é tido como o principal gatilho do FGFR3 (3) e, se levarmos em conta os resultados por Cinque et al. (1), também o é para o FGFR4. Ao tratar a acondroplasia com uma armadilha de ligante estaríamos impedindo a ação do FGF18 no FGFR3 (o que é bom), mas também no FGFR4. No primeiro caso, o resultado seria positivo, mas no último, quais seriam as consequências?

No estudo de Cinque et al. (1), os pesquisadores também observaram que tanto o FGFR3 e FGFR4 foram ativados pelo FGF18 em seus modelos. Ambos os FGFRs estavam ligados ao processo de autofagia, mas os pesquisadores notaram que apenas FGFR4 foi significativamente associado com o controle deste fenômeno. Aqui, novamente, vemos alguma redundância do efeito do FGFR4 (com o FGFR3), e por isso o nível de relevância do efeito do FGFR4 ainda tem que ser abordado, e novos estudos confirmatórios são necessários para entender melhor o papel do FGFR4 no processo de crescimento ósseo.

Enquanto isso, com os resultados impressionantes demonstrados pelo estudo com o sFGFR3 (6; Figura 3), é possível que o eventual efeito da redução da ativação FGF18 / FGFR4 seria compensado pelo resgate de crescimento promovido pela inibição da via do FGFR3.

Vamos continuar a seguir esses desenvolvimentos. O próximo artigo analisará novas informações sobre como controlar a produção de FGFR3. Não, não é sobre uma terapia genética, nada de edição de DNA.

Referências

1. Cinque L et al. FGF signalling regulates bone growth through autophagy. Nature 2015; 528:272–5. doi:10.1038/nature16063.

2. Kozhemyakina E et al. A pathway to bone: signaling molecules and transcription factors involved in chondrocyte development and maturation. Development 2015;142(5):817-31. Free access.


3. Ornitz DM and Itoh N. The Fibroblast Growth Factor signaling pathway. WIRE Dev Biol 2015;4(3):215–66. Free access.
4. Garofalo S et al.Skeletal dysplasia and defective chondrocyte differentiation by targeted overexpression of fibroblast growth factor 9 in transgenic mice. J Bone Miner Res 1999;14(11):1909-15. Free access.
 5. Davidson D et al. Fibroblast growth factor (FGF) 18 signals through FGF Receptor 3 to promote chondrogenesis. J Biol Chem 2005;280:20509-15. Free access.

6. Garcia S et al. Postnatal soluble FGFR3 therapy rescues achondroplasia symptoms and restores bone growth in mice. Sci Transl Med 2013;5:203ra124. doi:10.1126/scitranslmed.3006247.

7. Tolcher A et al. Preliminary results of a dose escalation study of the fibroblast growth factor(FGF) “trap” FP-1039 (FGFR1:Fc) in patients with advanced malignancies. 22nd EORTC-NCI-ACR symposium on molecular targets and cancer therapeutics, November 16-19, 2010. Berlin, Germany. Free access.

8. Ghivizzani SC. Delivery of soluble FGFR3 as a treatment for achondroplasia. National Institute of Arthritis and Musculoskeletal and Skin Diseases. 2013; Project Number: 5R01AR057422-04.

9. Therachon press release 2015. Free access.

 

Wednesday, November 11, 2015

Tratando a acondroplasia: o papel dos inibidores de tirosina-quinase

Introdução

A acondroplasia é causada por uma mutação no gene que codifica a (contém a informação química para criar) a proteína chamada
receptor de fator de crescimento de fibroblastos 3  (FGFR3). O FGFR3 é uma proteína que está ancorada através da membrana celular dos condrócitos (Figura 1). Ele tem três partes ou domínios: a parte fora da célula que funciona como uma antena, recebendo sinais dos FGFs; o domínio transmembrana, que "ancora" a proteína através da parede da célula; e o domínio intracelular, que é responsável pela propagação do sinal recebido fora da célula para outras proteínas dentro da célula.

Figura 1. Estrutura do FGFR3.




Proteínas são moléculas grandes e complexas constituídas por partes menores chamadas de aminoácidos. Estes aminoácidos são como peças de um modelo de Lego: cada um tem características distintas que, combinado com outros, conferem formas e propriedades especiais à proteína (Figura 2). A combinação certa de aminoácidos é, portanto, essencial para a função normal da proteína. Se você está curioso sobre aminoácidos, basta visitar a página Glossário do blog para algumas informações básicas ou ir a Wikipedia)

Figura 2. Combinando peças de Lego.

 


A combinação certa de aminoácidos em uma proteína é crucial para o seu funcionamento correto. Na acondroplasia uma única substituição (a mutação) de um destes aminoácidos deixa o FGFR3 mais ativo do que deveria. A função normal do FGFR3 é de reduzir a velocidade de crescimento do osso a partir de algumas estreitas estruturas localizadas nas extremidades dos ossos longos chamadas de placas de crescimento. Devido à mutação, o FGFR3 trabalha exageradamente e reduz significativamente a capacidade dos condrócitos que vivem nas placas de crescimento de multiplicar e amadurecer, o que conduz às características clínicas da acondroplasia.

Por que isto acontece?
 

Chamamos as proteínas que participam de reações químicas no corpo de enzimas. As enzimas são muito ativas e o FGFR3 não é diferente. Para controlar as atividades das enzimas, as células têm sistemas de "faxina" que permitem que essas enzimas, quando estão ligadas (ou ativadas), trabalhem somente por um período limitado de tempo. Na acondroplasia, a mutação faz o FGFR3 ficar mais estável e "resistente" a esses faxineiros, e por isso consegue se manter ativo por mais tempo.

Bem, o que isso tem a ver com o título deste artigo?

Espere mais um pouco, estamos chegando lá.

Uma enzima funciona através da transferência de cargas elétricas para outra proteína (um cliente, que pode ser outra enzima), provocando alterações no cliente. O cliente levará a carga elétrica para outro destino, por exemplo, uma outra proteína, um determinado local no interior do núcleo da célula, etc. Vai depender de sua(s) função(
ões). Pense em uma cadeia de dominó, uma peça empurrando a próxima, etc. Esta é a forma como as células funcionam. Para ajudar você a entender reações químicas enzimáticas em cadeia  ou cascatas de sinalização, convido você a assistir a animação logo abaixo, fornecida pelo Laboratório Cold Spring Harbor, que publiquei em um artigo anterior do blog (Animação 1).

Animação 1. Esta animação mostra como o corpo começa o processo de cicatrização após uma contusão na pele. A parte relevante começa aos 2:50 min, e mostra como um ligante (pense em um FGF) se junta a uma enzima receptora na superfície de uma célula (pense no FGFR3) e inicia a cascata de sinalização ou química.


DNA Learning Center. Cold Spring Harbor Laboratory

As enzimas são capazes de transferir essas cargas elétricas porque alguns dos aminoácidos nas suas estruturas têm as propriedades químicas adequadas para fazê-lo. No caso do FGFR3, existem alguns pontos na sua parte que está localizada dentro da célula ocupada pelo aminoácido tirosina (ver Figura 1). A tirosina pode se ligar a alguns carreadores (transportadores) de fósforo reativo (ATP) flutuantes nas proximidades dentro da célula, mas só irá fazê-lo se o FGFR3 for ativado (ligado) fora da célula. Quando o FGFR3 é ativado (você viu a animação 1?), através de várias complexas alterações em sua forma, ele expõe as tirosinas na sua parte intracelular, que por sua vez atraem o fósforo nas proximidades, iniciando uma série de reações químicas. Você deve levar em conta que estou simplificando muito o fenômeno de "ativação" aqui.

As regiões onde as tirosinas estão localizadas em FGFR3 são chamados "bolsos" de ATP. Estas bolsos
estão presentes em muitas outras enzimas com muitas funções diferentes nas células, de modo que essas estruturas não são exclusivas do FGFR3. Nós também chamamos essas regiões de domínios de tirosina-quinase (TKD) (Figura 1).

Ok, finalmente, vemos uma conexão com o título!

Há décadas, os cientistas sabem sobre estes bolsos de ATP. Eles descobriram que no câncer muitas das enzimas como o FGFR3 são utilizadas pelas células malignas para fazê-las crescer mais e mais rápido, então eles começaram a procurar abordagens que seriam capazes de bloquer esses bolsos. Em teoria, sem as reações químicas fornecidas por enzimas como o FGFR3, muitas células cancerosas morreriam e a doença
seria potencialmente controlada.

Na verdade, os cientistas já desenvolveram uma série de estratégias para atingir esse objetivo. Uma delas é exatamente através da criação de moléculas que podem se ligar aos TKD, impedindo a enzima de iniciar reações químicas. Estas moléculas são chamadas inibidores de tirosina-quinase (TKI). Já revi muitas delas com atividade contra o FGFR3 aqui no blog, mas na Tabela 1, você verá uma lista mais recente delas.

Tabela 1. Alguns TKIs recentes com atividade contra os FGFRs.


Para entender melhor como essas pequenas moléculas funcionam convido você a assistir a esta rica animação que mostra o mecanismo de ação do lapatinib (Animação 2), um TKI desenvolvidos para bloquear EGFRs, outra classe de enzimas que trabalham de forma semelhante aos FGFRs. Você verá que o lapatinib tem como alvo os bolsos de ATP na parte intracelular do EGFR.

Animação 2. Mecanismo de ação do lapatinib (áudio em italiano). 





Utilizar TKIs na acondroplasia?

Uma vez que existem tantas moléculas capazes de bloquear a atividade do FGFR3, por que não vemos mais pesquisas abordando o seu uso na acondroplasia? Esses medicamentos podem ser tomados como comprimidos, uma vez por dia. Não seria perfeito? O problema é que, como mencionado acima, os bolsos de ATP (os domínios de tirosina-quinase) são muito semelhantes em um grande número de famílias de enzimas que trabalham como os FGFRs. Você notou que eu não escrevi FGFR3 no título Tabela 1? Isto é porque nenhum desses compostos lá enumerados são específicos para o FGFR3. Eles também podem bloquear a atividade de outros FGFRs e de outras enzimas celulares. Para ilustrar esse recurso do TKIs, dê uma olhada no mapa das famílias de enzimas abaixo (Figura 3), que mostra os grupos de enzimas que alguns TKIs são capazes de bloquear.

Figura 3. Mapa das enzimas mostrando enzimas afetadas por alguns dos mais velhos TKIs. Cada ponto colorido significa que o TKI terá alguma ação sobre aquela enzima. Note-se a forma como o mapa é desenhado, como uma árvore vista de cima


Note o grande número de enzimas afetadas por esses TKIs. Imagem de:Stjepanovic N & Capdevila J. Biologics: Targets and Therapy 2014. Acesso livre. Reproduzido aqui apenas para fins educacionais.


Afetar diversas enzimas diferentes e suas funções, ao mesmo tempo, pode representar um enorme problema. Vários efeitos indesejados podem surgir quando essas drogas são utilizadas para tratar o câncer. No entanto, alguns dos efeitos adversos são toleráveis ​​ou aceitáveis devido à natureza da doença, e também porque, apesar de afetar várias enzimas ao mesmo tempo, inibidores de tirosina-quinase tendem a ser menos tóxicos do que o arsenal de quimioterapia mais antigo que continua a ser usado hoje em dia para lutar contra o câncer.

De fato, muitos TKIs como os acima mencionados já estão sendo utilizados na prática clínica para o tratamento de várias formas de câncer, mas apenas em adultos. Como sua atividade é promíscua podemos prever que os TKIs poderiam ser perigosos para o uso em
crianças, cujos corpos estão em crescimento. Essas enzimas participam de processos fundamentais de desenvolvimento e bloqueá-las em uma criança poderia causar muitas consequências ruins.

Pesquisadores como o Dr. Moosa Mohammadi, da New York University, e a Dr Kalina Hristova, da
Johns Hopkins University , tem trabalhado duro para entender melhor o grupo de enzimas FGFRs e/ou os bolsos de ATP. Eles criam modelos computadorizados em 3D das enzimas, tentando mapear onde os aminoácidos estão localizados para que possam prever como estas enzimas trabalham e assim ajudar a serem desenvolvidas novas moléculas para caber nos lugares certos, embora isto não seja fácil de fazer. Você pode ver o trabalho do Dr. Mohammadi fazendo uma simples pesquisa no Pubmed.

Os anti-FGFR atuais não podem ser utilizados para tratar a acondroplasia

Talvez devido aos riscos previsíveis, é improvável que os atuais inibidores da tirosina-quinase possam ser utilizados na acondroplasia. Há evidências em testes de laboratório que eles funcionam (1), mas, por causa de sua falta de especificidade, esses TKIs não são candidatos a chegar serem utilizados clinicamente para tratar a
acondroplasia.

Para trazer mais dados sobre a utiliza
ção de TKIs na acondroplasia, o grupo liderado pelo Dr. Pavel Krejci, um pesquisador entusiástico na área do FGFR3, acaba de publicar um convincente estudo no qual exploraram exatamente o uso de alguns desses TKIs conhecidos por serem mais específicos para as enzimas da família FGFR em condrócitos e culturas de osso (2). Alguns dos inibidores de tirosina-quinase testados no seu trabalho estão listados na Tabela 1 acima. Após a realização de uma longa série de testes, tanto em culturas de células, cultura de osso e em modelos animais, o grupo concluiu que seria arriscado usar os atuais TKIs em desenvolvimento na acondroplasia, exatamente porque eles bloqueiam outras enzimas importantes para o desenvolvimento do organismo em crescimento.

Exclusividade é difícil de alcançar

Para entender por que essas moléculas criadas para bloquear os bolsos de ATP afetam várias enzimas, vamos voltar ao mapa das enzimas acima e conferir a sua distribuição. Você notará que as hastes das famílias des enzimas surgem de um tronco principal, como em uma árvore. Isto significa que, embora existam centenas de enzimas diferentes hoje, todas eles vieram de alguns poucos antepassados, e por isso mantém uma grande semelhança entre si, o que é chamado pelos cientistas de homologia. Os quatro FGFRs são muito semelhantes, compartilhando mais de 50% da sua estrutura entre os quatro membros (3).

Como assinalado por vários investigadores, incluindo o Dr. Krejci, uma molécula bem sucedida do grupo TKI para o tratamento da acondroplasia terá de ser muito seletiva para o FGFR3, com nenhum efeito nas proteínas irmãs ou em enzimas de outros grupos. Isso vai levar ainda algum tempo mais para se alcançar, e o sucesso será baseado, pelo menos em parte, em aperfeiçoar a capacidade de projetar modelos
de enzimas no computador que sejam capazes de simular seu estado natural e sua dinâmica na célula viva.

Isto apenas significa que precisamos estar abertos para as várias opções disponíveis para enfrentar enzimas hiperativas como o FGFR3 na acondroplasia. Bolsos de ATP têm sido os alvos mais pesquisados ​​porque eles são fáceis de atingir. No entanto, existem outros locais na estrutura da proteína que podem ser abordados. Convido você a rever os artigos anteriores no blog. Você vai descobrir que há muitas idéias por aí, esperando por um desenvolvedor que não esteja pensando somente nos alvos mais fáceis de alcan
çar.

Referências

1. Jonquoy A et al. A novel tyrosine kinase inhibitor restores chondrocyte differentiation and promotes bone growth in a gain-of-function Fgfr3 mouse model. Hum Mol Genet 2012;21(4):841-51. Free access.

2. Gudernova I et al. Multikinase activity of fibroblast growth factor receptor (FGFR) inhibitors SU5402, PD173074, AZD1480, AZD4547 and BGJ398 compromises the use of small chemicals targeting FGFR catalytic activity for therapy of short stature syndromes. Hum Mol Genet 2015 Oct 22. pii: ddv441. [Epub ahead of print].

3. Ho HK et al. Current strategies for inhibiting FGFR activities in clinical applications: opportunities, challenges and toxicological considerations. Drug Discov Today 2014 Jan;19(1):51-62.

Wednesday, June 17, 2015

Vosoritide (BMN-111) induz aumento de 50% na velocidade de crescimento em crianças com acondroplasia

Introdução

A Biomarin divulgou hoje os resultados do estudo de fase 2 do BMN-111 (agora chamado de vosoritide) em crianças com acondroplasia.

Em resumo, a droga não mostrou problemas de segurança relevantes em nenhuma das doses testadas. Além disso, em termos de eficácia, como o desenvolvedor tem enfatizado ultimamente em reuniões públicas financeiras, a maior dose (15mcg/kg/dia) induziu um aumento médio de 50% na velocidade de crescimento (Tabela 1).

Table 1: BMN 111 (vosoritide) Summary of Efficacy Results from Phase 2 Study in Children with Achondroplasia
Efficacy Analysis: Annualized 6-Months Growth Velocity
Cohort 1 Cohort 2 Cohort 3 
Growth Velocity2.5 µg/kg/daily7.5 µg/kg/daily15 µg/kg/daily
(n=8*) (n=8)(n=10)
Baseline
Mean (cm/Year)3.82.94.0
Post-Treatment 
Mean (cm/year)3.44.26.1
Change from Baseline
Mean (cm/year)-0.41.32.0
95% Confidence Interval (cm/year)-1.8, 1.10.1, 2.50.6, 3.4
p-value**0.560.040.01
Percent increase from Baseline
Based on means (%)NM4550
* One subject withdrew from study prior to the 6-month visit, all summaries for Cohort 1 were based on 7 subjects.
** p-value, provided for descriptive purposes and based on the paired t-test comparing post-treatment GV and baseline GV, not adjusted for multiple comparisons. 
From Biomarin's press release, available here.


O que significa este aumento de 50% na velocidade de crescimento?

Dados históricos mostram que crianças normais pré-púberes crescem a uma média de 6 cm/ano. Como podemos ver na tabela acima, a velocidade média de crescimento na acondroplasia antes da terapia foi de 4 cm. Como vimos no último artigo do blog, as expectativas eram de que a droga poderia levar a um aumento na velocidade de crescimento que traria as crianças em tratamento a uma taxa mais próxima ou semelhante à média normal da velocidade de crescimento. Agora, isso foi confirmado.

Quais são os próximos passos?

A Biomarin anunciou que agora irão reunir-se com a FDA para iniciar o estudo principal de registro (fase 3) ainda este ano. Mantêm o interesse em iniciar uma quarta coorte (fase 2) com uma dose maior de vosoritide (30mcg/kg/dia). Também mencionaram o plano de realizar um estudo em crianças menores que cinco anos.


Você pode ler o comunicado de imprensa aqui (em inglês). Você também pode ouvir a conferência de áudio gravada, disponível aqui (em inglês).